quinta-feira, 18 de março de 2010

Ciranda do Livro

Nesta semana começou, na unidade, a Ciranda do Livro, projeto que consiste em, através da troca de livros (que ficam em uma estante no pátio, expostos de maneira livre, para que todos lhes tenham acesso), estimular a leitura entre os alunos. Em sala de aula, na semana que passou, os professores de Literatura trabalharam um texto e um vídeo que serviram para sensibilizar os alunos ao projeto e, principalmente, ao ato de ler. Postamos aqui, na íntegra, ambos os materiais para vocês. E não deixem de participar da Ciranda! Sem vocês, ela vai girando devagar.. devagar... até definhar de vez. E nós não queremos isso, não é? ;)

O jovem não deve ler

            Calma, prezado leitor. Nem você leu errado, nem eu pirei de vez. Este artigo pretende isso mesmo: dar novos motivos para que moços e moças de nosso Brasil continuem lendo apenas o suficiente para não bombar na escola.
            E continuem vendo a leitura como algo completamente estapafúrdio, irrelevante, anacrônico, e permaneçam habitando um universo ágrafo e pobre de ideias e ideais.
            Epa! Acho que exagerei! Afinal, quem não lê, muito dificilmente vai conseguir compreender esta última frase. Desculpe aí, manos: eu quis dizer que os carinhas, hoje, precisam de dicionário pra entender gibi da Mônica, na onda dos sarados e popozudas que veem na telinha, e que eu vou dar uma força pra essa parada aí!
            Eu explico mais ainda: pensei em escrever sobre a importância da leitura. Algo leve, mas suficiente para despertar em meia dúzia de jovens o gosto pela leitura (de quê? De tudo! De jornais a livros de filosofia; de bulas de remédio a conselhos religiosos; de revistas a tratados de física quântica; de autores clássicos aos mais modernos).
            Daí aconteceram três coisas que me fizeram mudar de rumo e de ideia.
            Primeiro eu li que fizeram, alguns meses atrás, um teste de leitura com estudantes do Ensino Fundamental de uma dezena de vários países. Era para avaliar se eles entendiam de verdade o que estavam lendo. Adivinhem quem tirou o último lugar, até mesmo atrás de paizinhos miseráveis e perdidos no mapa? Acertou, o nosso Brasil!
              Logo depois, li uma notícia boa que, na verdade, é ruim: o governo do Estado de São Paulo anuncia maior número de crianças na escola. Mas adotou a política da não-reprovação. Traduzinho: o aluno passa de ano, sim, mas continua tecnicamente analfabeto. Porque ler sem raciocinar é como preencher um cheque sem saber quanto se tem no banco.
            E, por último, li em pesquisa publicada recentemente nos jornais que, para 56% dos brasileiros entre 18 e 25 anos, comprar mais significa mais felicidade, pouco se importando com problemas ambientais e sociais do consumo desenfreado. Ou seja, o jovem brasileirinho gosta de comprar muitas latinhas de cerveja, mas toma todas e joga todas nas ruas ou nas estradas, sem remorso.
            Viram como ler atrapalha?
            Com a leitura, a gente fica sabendo de fatos que, se não soubesse, teria mais tempo para curtir o próprio umbigo numa boa, sem ficar indignado e preocupado com a situação atual de boa parte de nossa juventude.
            A leitura também faz o tico e o teco (nossos dois neurônios que ainda funcionam) malharem e suarem, em vez de ficarmos admirando o crescimento do bumbum e do muque no espelho das academias de musculação.
            Por isso que, num momento de desalento, decidi que, de agora em diante, como escritor e professor, nunca mais vou recomendar a ninguém que leia mais, que abra livros para abrir a cabeça.
            A realidade é brutal e desmentiria em seguida qualquer motivo que eu desse para um jovem tupiniquim trocar a alienação pela leitura.
            Eu reconheço: a maioria está certa em não ler.
            E tem, no mínimo, cinco razões poderosas, maiores e melhores que meus frágeis argumentos ao contrário:
1. Se ler, vai querer participar como cidadão dos destinos do país. Não vale a pena o esforço. Alguma vez alguém já disse que a juventude não gosta de política, e, por isso, os políticos a adoram e fazem dela o que bem entender.
2. Se ler, vai saber que estão mentindo e matando milhares de jovens todos os dias em todos os lugares do Brasil. Principalmente porque esses jovens não percebem nem têm como saber (a não ser lendo) a tremenda cilada que é acreditar que bacana é mentir e matar também.
3. Se ler, vai acordar um dia e se perguntar que diabo é isso que anda acontecendo nesse lugar, onde só ladrões, corruptos e ignorantes aparecem na mídia.
4. Se ler, vai ficar mais humano e, horror dos horrores, é até capaz de sentir vontade de se engajar num trabalho comunitário, voluntário, e parar de ser egoísta.
5. Se ler, vai comparar opiniões, acontecimentos, impressões e emoções e vai acabar descobrindo que sua vida andava meio torta, que suas ideias estavam meio bêbadas.
            O espaço está acabando e me deu vontade de lembrar que ninguém – nem mesmo alguém que não vê utilidade na leitura – pode achar que há um belo futuro aguardando uma juventude que vai de revólver pra escola e, lá, absorve não conhecimentos, mas um baseado ou uma carreirinha maneira. Sim, é outra pesquisa que li: três entre dez estudantes brasileiros andam armados ou se drogam na escola.
            Mas paro por aqui já que, apesar destes tristes tempos, lembro também de tantos poetas, jornalistas e escritores que, ao longo de minha vida de leitor apaixonado, me deram toques de esperança, força e fé na mudança.
            Lembro de um especialmente – o poeta Tiago de Melo – com seu verso comovido e repleto de coragem:  “Faz escuro, mas eu canto”.
            Talvez meu pequeno cantar sirva de guia do homem e da mulher de amanhã. E que, lendo mais, ele ou ela evite ter como única alternativa para mudar de vida dar a alma ou engolir baratas e a dignidade diante das câmeras de televisão.
(Ulisses Tavares)



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